A viagem que ligou Beihai a Jinghong começou às 11.50 e terminou no dia seguinte às 17.30, com muito pouco de espera entre as ligações. Em traços gerais, a viagem decorreu em três partes: Beihai – Nanning e Nanning – Kunming (comboios) e Kunming – Jinghong (autocarro). Durante todo este tempo fui escrevendo no caderno, comi toda a comida que tinha comigo, dormi, comecei a ler e a filtrar informação sobre o meu novo destino – Laos – e observei a paisagem predominantemente rural – vilas minúsculas, plantações, bananeiras, cursos de água barrentos, colinas verdes, vegetação luxuriante e super-densa, a ponto de pensar se não estaria a ver, a selva. 🙂
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A viagem para Beihai correu de forma atribulada, primeiro de tudo o autocarro que deveria ter partido às 15.30, partiu às 19.30, “apenas” quatro horitas de atraso! 😛 De qualquer modo estou a ser injusto, pois às 16.30 avisaram-nos desta mudança. Merci! 🙂 Durante esse tempo, coloquei músicas no telemóvel, escrevi no caderno e conheci um casal de chineses que se preocuparam comigo e que mesmo sem falarem inglês me ajudaram durante a viagem. 🙂
Quando finalmente apanhámos o autocarro… fizemos uma viagem de cinco minutos, até ao porto onde fomos largado e aí tivemos que esperar, desta feita pelo ferry até às 21.00. Durante a travessia que durou aproximadamente duas horas aproveitei para comer com eles: dois ovos, gelatinas, sementes para mascar, frutos secos, uma maçaroca de milho e uma perna de frango do KFC. 🙂 Às 23.00 e já na China continental entrámos finalmente no autocarro e eu preparei-me para dormir até ao amanhecer, porém… Nova surpresa, o “amanhecer” foi às 3.15 e nessa altura fomos largados em Beihai! Ups!
O que valeu foi que eles, bondosamente, não me abandonaram, meteram-se num tuk-tuk comigo e pediram ao motorista para nos conduzir até ao hostel. O problema é que o mesmo… era numa rua “quaternária” 😛 e depois de meia hora às voltas e de um telefonema não atendido, nada de hostel! Por volta das 4.00, voltaram a revelar toda a sua bondade e disseram – linguagem gestual – para não me preocupar, pois ficaria a dormir em casa deles. 😀
Antes de partirmos dei dinheiro ao nosso motorista, pedi-lhe desculpa pelo sucedido e arrancámos a todo o gás até ao KFC mais próximo. Quando aí chegámos, o rapaz saltou primeiro do tuk-tuk e depois um separador central e em menos de nada estava de volta com um saco de papel nas mãos, sorridente e triunfante. Na chegada à casa deles comemos cada um, um belo hambúrguer e depois de um banho, dormimos o merecido sono dos heróis. 😀
Dá um Mergulho
No segundo dia em Sanya depois de voltar da praia e do jantar falei com o Peter´s que me contou que mesmo de noite as pessoas, ainda estão: a) na praia, b) dentro de água. Assim que ouvi isso fiquei de pulga atrás da orelha e decidi que tinha de ir experimentar, afinal o tempo era quente (30 ºC), a água morna e o mar uma piscina de fundo liso… why not? 🙂
Desse modo, eram 22.00 quando peguei na toalha e dirigi os meus passos para a praia. A noite estava quente, tal e qual como o dia e os bares da praia, cheios. E pensei: “serão os chineses de Hainan uma “classe” à parte dentro da China?” Fica a questão. A praia estava iluminada pela luz dos bares e a quantidade de pessoas tanto no areal como na água surpreenderam-me, pois eram muito mais do que eu imaginara. 🙂
Larguei as poucas coisas que tinha e fora da “caixinha de controlo” (área delimitada no mar com cordas) dei o meu mergulho no mar e senti-me feliz por ter a oportunidade de fazer algo assim. 😀 Do mar viam-se os prédios da linha costeira da baía iluminados pela luz dos bares e o mar não era uma massa escura. Queria mais, queria uma massa mais negra e opaca, e menos pessoas nas imediações. Por isso voltei a pegar nas minhas coisas e comecei a andar pelo areal até encontrar um lugar com as características acima referidas. A meio da praia, apesar de não existir uma escuridão total encontrei uma ausência total de pessoas e aí, sozinho no mar fiquei a boiar, a olhar o céu e senti-me livre e privilegiado, por aquele momento de paz e serenidade, proporcionado pelo mar quente do sul da China. 😀
O Asteróide, Didier!
Esta história passou-se na Captain´s House, no dia em que conheci o Peter´s e tudo começou quando chegámos da rua com uma cerveja na mão e nos dirigimos para o terraço onde ficámos um bocado à conversa, quando… a Terra foi atingida por um asteróide, chamado Didier e o mesmo teve consequências quase catastróficas! 😛 Mas, afinal o que/quem será Didier? Didier era o tio do Robert e um party animal de um calibre bastante elevado! 😀
Assim que se sentou ao pé de nós começou logo a oferecer cervejas, depois ofereceu uma “zurrapinha” e mais uma cerveja, depois uns noodles absolutamente divinais -talvez os melhores que comi na China – ovos com tomate e carne – para ensopar – e mais… umas cervejinhas! 😀
Ao que parece Didier fora cozinheiro, professor e agora estava reformado. Eu e o Peter´s estávamos deliciados com aquela recepção – o Peter´s então estava nas nuvens, talvez por ter sido a primeira vez que estava a sentir a bondade dos desconhecidos, pelo menos com aquela intensidade! – e a única coisa que pudemos fazer foi entrar no ritmo e “dançar” com leveza. O tempo foi passando e foram aparecendo e desaparecendo pessoas, um casal de gays (polaco), uma inglesa e uma americana e o próprio Robert. Foi um serão de magnífico, proporcionado pelo asteróide, Didier! 😀
A longa viagem começou às 9.30 em Ping´An com a team da noite anterior a apanhar um pequeno autocarro completamente apinhado – tanto de turistas como de camponeses. Assim que chegámos à estrada principal, apanhámos um novo autocarro, desta feita para Guilin, que apesar de bem preenchido ainda tinha lugar para nós – mas mesmo à conta, pois a partir daí só sentados em bancos de plástico! 😛 Na chegada à cidade despedimo-nos, pois os quatro “magníficos” estavam todos de partida para destinos diferentes, e felizmente para mim ainda fui a tempo de comprar o bilhete para Haikou. Quando entrei no autocarro, fiquei contente porque o mesmo tinha camas e apesar de ter apanhado vários meios de transporte na China, esta era a primeira – e possivelmente a última – vez que iria viajar deste modo. Antes de entrar tive de descalçar-me e o ambiente era gelado – fruto de um A/C fortíssimo – em contraste com o ar extremamente abafado da rua.
Durante a viagem aproveitei para escrever no caderno, observar a verde paisagem e dormir três ou quatro horas, pois pensava que o autocarro iria ser conduzido até ao destino final, porém… às duas da manhã estancámos e fomos mandados sair. Neste momento pensei que íamos mudar de autocarro e por gestos pedi ao motorista para abrir a bagageira para tirar a mala, mas nada. Voltei a apontar e a fazer sinal de bagagem e… nada! Nesta altura comecei a ficar um bocado stressado e voltei a insistir que queria a bagagem. Com cara de caso, lá levantou o cu do seu assento “real” e contrariado lá abriu a bagageira. Tirei a mala, pû-la às costas e nos entretantos o motorista estava a gozar comigo em chinês. Olhei para ele e para os outros passageiros e transmiti corporalmente algo do género: “Ahahahahaha! Realmente uma graça do c@&%#$£!”.
Depois deste acontecimento, um casal de jovens universitários pôs conversa comigo e então lá me explicaram que a bagagem continuava no autocarro porque íamos apanhar um ferry para a ilha de Hainan e depois já na “outra margem” voltaríamos a seguir viagem no mesmo. A espera pelo ferry foi longa e nesta altura estava cansado e sentia os olhos a quererem fechar, mas lá me consegui ir aguentando. A viagem propriamente dita durou apenas uma hora e uns pozinhos e quando chegámos finalmente ao porto de Haikou eram quase seis da manhã. Quando apanhei um autocarro para o hostel, pensei que a história acabava aí, porém… havia um detalhe muito importante! Para sair da ilha de Hainan em direcção a Beihai teria que marcar um ferry com um par de dias de antecedência… e com esse “pequeno” detalhe tudo mudou. Decidi que não queria ficar a “secar” em Haikou – quando voltasse daí a uns dias, marcaria o famoso ferry e visitaria a cidade nessa altura – por isso e ainda no hostel marquei uma cama em Sanya e segui para uma das estações de comboios da cidade. Aí comprei o meu bilhete para o ”TGV” – não havia outro tipo de comboio – e às 10.35 parti qual uma bala, rumo ao extremo sul da ilha, rumo a Sanya.
Amanhecer no Paraíso
Quando o despertador tocou, acordámos como previamente combinado, mas ao olhar pela janela iniciámos um “debate” prolongado se deveríamos ir ou não, pois o tempo estava muito… muito enfarruscado. Eu e o Fábio já nos tínhamos voltado a deitar, mas o British levantou-se, começou a encasacar-se e ao vermos a sua força de vontade, recuperámos “psicologicamente” e levantámos o rabo da cama de modo a acompanharmos o nosso “irmão de armas”. 🙂
A verdade é que não vimos o nascer do sol, mas diga-se em abono da verdade, do local onde nos encontrávamos – miradouro dos “Nove Dragões e Cinco Tigres” – mesmo com bom tempo, tal seria sempre impossível devido à sua orientação geográfica relativamente ao vale. 😛 De qualquer modo vimos umas nuvens extraordinárias e houve um momento em que se pôde ver uns reflexos de sol nos socalcos e noutro momento o vale iluminado, vá… parcialmente. Não foi perfeito, mas foi bem melhor que ficar na cama a dormir! 🙂
Depois de um dia tão perfeito, quando regressámos ao hostel, havia mais uma surpresa… na receção encontrei Fábio – um rapaz brasileiro que conheci em Xi Ping, mas com quem apenas falara cinco minutos, pois ele partiu no dia em que cheguei – e o dia fechou com chave de ouro. Entretanto Zheng, juntou-se a nós e quase sem darmos por isso um rapaz de feições asiáticas, mas com um “British” perfeito seguiu-lhe o exemplo. O seu inglês era de tal modo irrepreensível que a certa altura da conversa não me “contive” e perguntei-lhe de onde era e quando ele respondeu que era Britânico, tudo fez sentido. Entretanto, ficámos a conversar e todos – exceto Zheng – bebemos uma “jola”. 🙂 Entretanto o tempo foi passando e descobrimos que estávamos com fome e decidimos jantar no hostel. A verdade é que tive mais uma magnífica refeição: abóbora, arroz, arroz aromatizado dentro de uma cana de bambu, carne de porco e vegetais, outros vegetais e ovo com tomate, e para finalizar a noite, parodiámos com uma frase profunda encontrada numa garrafa de cerveja: ”Se sabes onde ir, o mundo levar-te-á lá…” 😛 e rimos… rimos… rimos, antes de combinarmos acordar cedíssimo para ver nascer o sol. 🙂
Visões do Paraíso
Depois dessa extraordinária experiência regressámos de papo e alma cheia a Ping´An, sob o signo de uma meteorologia muito mais suavizada e leve, e quando chegámos Milène despediu-se de nós, mas antes teve de “pagar pelo divórcio” – piada inventada, pelo facto de eu ter pago o almoço e as compras dela, tal e qual um bom marido deve fazer! 😛
Eu e Zheng partimos finalmente para ver os terraços em todo o seu esplendor – ou quase devido à inexistência de sol – e o primeiro miradouro que visitámos chamava-se “Nove Dragões e Cinco Tigres” – os chineses e os seus nomes poéticos. A forma dos socalcos assemelhava-se às costas de um dragão (Longjie) e a visibilidade era total, a cor da água nos mesmos variava entre múltiplos castanhos e cor de prata e as formas eram harmoniosas e belas, como uma sinfonia perfeita criada pelos deuses e tocada pelos anjos. 😀 Senti-me um privilegiado por ter a oportunidade de assistir a um espectáculo tão magnífico e ver uma simbiose inigualável entre a natureza e o ser humano. Estava a ver uma paisagem criada por ambos e que resulta numa das paisagens mais belas e singulares que alguma vez vi. Ter tido a oportunidade de ter presenciado e fotografado este local deixou-me FELIZ e ENCANTADO, pois dei o meu cunho pessoal à paisagem, através dos enquadramentos escolhidos. 😀
Por sua vez, o segundo miradouro que vimos chamava-se “Sete Estrelas e a Lua” e também se revelou uma ode à beleza, mas “infelizmente” para o mesmo, o meu coração já se tinha apaixonado. 🙂 De qualquer modo, observei e encontrei muita beleza no local, não deixando de continuar a tirar um prazer extraordinário da paisagem, e antes de voltar ao hostel, disse a mim próprio que já tinha tido as minhas visões do Paraíso. 😀
Vamos Brincar aos Turistas?
No nascer do dia o tempo continuou cinzento, mas a intensidade da chuva baixou consideravelmente e aproveitando esse facto, partimos para a vila de Zhonglu acompanhados de uma rapariga alemã – Milène – que conhecemos na noite anterior. A caminho da vila e apesar da visibilidade reduzida, fruto do nevoeiro, comecei a perceber in loco a fama deste local e a interiorizar a beleza do mesmo, uma vez que à medida que subíamos, os socalcos começaram a ganhar forma, proporção e grandiosidade. 🙂
Por entre estradas de cascalho, degraus, trilhos em pedra e lama, plantações, camponeses e camponesas, burros e cavalos, seguimos viagem e passado uma hora e meia estávamos no nosso destino. Poucos minutos depois de lá chegarmos uma “nativa”, tomou a Zheng como guia turística de mim e da Milène e perguntou-lhe se queríamos almoçar, apresentando o seu preço. A Zheng entretanto começou a explicar-nos o que se estava a passar e a partir desse momento representámos o papel de um casal de turistas alemães que estava a ser conduzido para a toca da raposa. 😉 No final de muita conversa e discussão conseguimos baixar o preço para metade do valor inicial, em que 2/5 desse valor reverteriam para a Zheng e o restante para a “nativa”. Moral da história: como a Zheng estava a representar o papel de guia, no final iríamos todos comer por um 1/5 do valor previamente acordado… uma bagatela! 🙂 De qualquer modo, foi muito interessante perceber, como este tipo de negócios se processa, em que todos ganham e o turista é depenado! Porém desta vez a presa passou a predador e a raposa não percebeu que estava a ser comida por um lobo com pele de ovelha!
Fomos então conduzidos até uma casa antiga e aí encontrámos “relíquias” expostas nas paredes de madeira, entre as quais e para mim o ex-líbris do local, um cartaz do “camarada” Estaline. 😛 No segundo piso encontrámos um sótão/depósito de lenha e enquanto a nossa cicerone acendia o lume no piso térreo, nós explorámos o local. Quando descemos, o lume já estava aceso e a nossa cozinheira estava a lavar batatas e a pelá-las. Iniciámos então um momento culinário e de partilha, quando começámos a ajudar na preparação do almoço. 🙂
Quando terminou toda a confeção, vimos quão barata estava a ser a refeição e como menu tínhamos: batatas novas, carne de porco fumada, grelos, sopa de ovo e tomate e arroz. Para além da quantidade, a qualidade era extraordinária! Tudo fresco, tudo saboroso, tudo… DIVINAL! 😀 Sem dúvida um dos melhores momentos gastronómicos e uma das experiências mais fascinantes da viagem até à data. 😀 Durante a refeição fomos dizendo que até o valor inicial era barato, mas naquele momento a roda já tinha sido posta em marcha.
Depois do repasto a senhora foi buscar um casaco tradicional e trouxe-nos artesanato barato e artesanato personalizado, nessa altura compensámos um pouco a senhora – do preço do almoço – pois a Milène acabou por lhe comprar uns postais e uma fita bordada, mas claro que pelo meio ainda regateámos um pouco… e finalizámos toda a nossa encenação com as fotografias da praxe, em que ainda deu para rir com a diferença de estatura da Milène e da senhora – David e Golias, versão feminina 😛 . Todo este momento memorável durou aproximadamente três horas, mas foi de tal modo fascinante e singular que o tempo extravasou para o plano subjetivo e deixou de ser real. 😉
No dia anterior fruto do tempo carregado, eu e o Greg não chegámos a sair da vila, tão pouco conseguimos ver o nascer do sol e a nossa despedida foi efetuada no corredor do hostel. Estavam lançados os dados para o que seria este dia. Às 8.55 eu e a Zheng apanhámos o autocarro para Guilin e depois de percorrido meio caminho, começou a chover. A chegada à cidade foi abençoada por uma chuva torrencial e da estação de autocarros onde parámos – que mais parecia um depósito de autocarros – para a estação Oeste percorremos o caminho num pequeno autocarro local. Aí apanhámos um novo autocarro e durante o trajeto continuou a chover com intensidade.
Ao sairmos do autocarro, perguntaram-nos se queríamos seguir viagem num dos famosos “táxis manhosos”, ao que respondemos que não estávamos interessados e que íamos esperar pelo autocarro regular. O problema é que esse autocarro, deveria ser invisível pois nunca mais aparecia 😛 e depois de muita chuva, um almoço à base de doces, perguntas de quando o autocarro viria, conversas sobre música, muita chuva e… duas horas depois rendemo-nos à fatalidade que tínhamos de apanhar o “táxi”.
O último troço, foi realizado numa estrada esburacada e lamacenta, serpenteando montanha acima com visões de um rio a correr com pujança e vigor e de zonas onde tinham ocorrido deslizamentos de terras. Para ajudar à festa, continuou a chover mas diga-se em abono da verdade, nunca mais tinha parado de chover. Nunca! A chegada a Ping´An foi feita sob o signo da chuva e da névoa e naquele final de tarde quase que podia jurar que estávamos numa vila fantasma, onde apenas circulavam dois ou três “fantasmas” de capas plásticas transparentes e um silêncio tão pesado que se ouvia cada passo dado.

















