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Nanquim e o Massacre

O dia ainda estava a meio, mas já tinha havido muitas emoções. Porém eu queria mais e achei que a minha viagem em Nanquim devia começar pelo Museu do Massacre, que é o local que homenageia os 300.000 mortos da cidade durante o período que antecedeu a segunda Guerra Mundial. Em 1937 o Japão invadiu a China e tomou de assalto grande parte do vasto território chinês e durante um “curto” período de seis semanas – 13 de Dezembro de 1937 a final de Janeiro de 1938 – a cidade foi reduzida a escombros e a população vítima da brutalidade de grande parte do exército japonês: violações – individuais e em grupo – fuzilamentos indiscriminados, abusos sobre a população, decapitações… enfim o lado negro do ser humano em todo o seu ”esplendor”. 😦

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A experiência começou na porta de entrada com a observação de uma gigante “massa” chinesa à espera de entrar, mas felizmente depois de uns minutos a situação foi desbloqueada. Assim que entrei no recinto vi que o complexo está dividido em duas zonas: exterior – Parque e Memorial e interior – Museu e Arquivo.

IMG_8419 (FILEminimizer)Porque via o relógio a andar depressa e a hora de encerramento a aproximar-se fui primeiro à zona interior e logo de início tomei a resolução de não tirar fotografias, não sentia aquele lugar como turístico, apesar da quantidade de pessoas que por lá circulavam. Antes como um grande memorial da tragédia e um local para preservação da memória histórica e colectiva de uma cidade, de uma nação, da humanidade.

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Na primeira sala, a entrada tinha o molde de uma mão e coloquei a minha mão lá, não sei se para sentir o metal se o peso da história. A sala ampla estava pouco iluminada. No teto o fatídico número 300.000 brilhava, no chão um ponto luminoso por cada vítima. Nas paredes o nome das vítimas gravado em relevo. Não aguentei, fiquei comovido e soltei duas lágrimas furtivas. A visita continuou e sala após sala vou observando o museu e as pessoas que lá circulavam e encontro de tudo: semblantes carregados, graves e sérios, sorridentes (?), atentos e comovidos até às lágrimas – mulheres. O museu vai pintando os negros acontecimentos e eu sigo por aquele espaço, tornando-me menos ignorante. Um dos momentos mais surpreendentes surge quando vi uma suástica nazi pintada das cores da cruz vermelha e ao lado deste, outros dois momentos me ficam particularmente na memória, o da grande parede dos arquivos e a zona dos 12 segundos: 300.000 mortos em seis semanas. A cada 12 segundos o som de uma gota a cair e o retrato de uma das vítimas a iluminar-se – durante essas fatídicas seis semanas, uma vida desapareceu a cada doze segundos na cidade de Nanquim!

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Na zona exterior circulei pelo parque e pelos memoriais, e o momento mais marcante ocorreu quando vi as ossadas humanas encontradas numa escavação arqueológica. A diferença aqui foi saber que não morreram há milhares ou centenas de anos, foram mortas durante o século XX e enterradas em valas comuns. Tão distante e tão próximo…

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Crónicas Em trânsito

Em trânsito: Hankou – Nanquim. A Estupada Continua!

Cheguei à bonita e clássica estação de Hankou por volta da 1.10 e depois de comprar o bilhete para a ligação final, fui até ao Macdonald´s onde comi e tentei apanhar wi-fi – sem sucesso. Uma vez que o comboio apenas estava marcado para as 4.20 aproveitei para organizar as fotografias de Fenghuang, atualizar o Excel, vi chover na rua e escrevi no caderno “em tempo real”. Quando finalmente me dirigi à estação de comboios senti-me esmagado pela monumentalidade do átrio superior e aí apanhei wireless e verifiquei que em Nanquim iria ter de improvisar – relativamente ao hostel – e quando vi as pessoas a apressarem-se para entrar no comboio, fiz o mesmo. Ao chegar dentro do comboio e quando verifiquei que tinha de ficar à espera para partir, pensei que fora um idiota, pois devia ter aproveitado a ligação para pelo menos ter tirado a morada de um hostel. :/

IMG_8409 (FILEminimizer)Às 7.00 da manhã acordei com o rabo a doer do assento rijo e com vontade de dar uns safanões ao vizinho do lado, pois ele estava a “abusar” do “meu” espaço, e momentos antes de chegar ao meu destino ainda deu para “assistir” a um assalto de uma bolsa. Aliás, não assistir, pois ali à volta ninguém viu nada e só percebemos o que aconteceu quando dono da mesma se começou a queixar que o tinham roubado! 😦 A minha estupada continuou na chegada à cidade, pois quando desembarquei não tinha nenhum hostel marcado, nem sequer uma simples morada onde dirigir-me! Por isso e antes de abandonar a estação de comboios andei a tentar arranjar uma ligação à internet. Após muito custo e algumas tentativas falhadas, encontrei um casal de espanhóis com um smartphone e estes lá me ajudaram. Finalmente, comecei a ver alguma luz ao fundo do túnel e um final à vista para esta odisseia, que ligou Fenghuang a Nanquim. 🙂

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Em trânsito: Fenghuang – Wuchang. Estupada!

Desde o momento que comecei a preparar a minha viagem, sabia que havia uma zona da China onde as ligações eram uma incógnita completa. Esse momento acabara de chegar, pois a ligação entre a zona central do país e Nanquim  uma das únicas três cidades que foi a capital da China, para além de Xi´an e Pequim  e que não fica assim tão distante de Xangai era o meu próximo passo. E este, era um graaaaaaande passo! Pelo menos em termos de distância. 🙂

A primeira fase da viagem decorreu entre Fenghuang – partida às 12.30 – e Changsha e foi feita de autocarro. Durante a viagem escrevi no caderno, dormitei um pouco e observei a paisagem que se resume em poucas palavras: auto-estrada e tempo muito cinzento. Quando entrámos em Changsha, não fazia a mínima ideia para onde é que estaria a ser levado e mentalmente estava a tentar relaxar pois o tempo estava a passar muito rapidamente e o meu limite para apanhar o comboio estava a ficar muito reduzido. Quando saí do autocarro (18.30) chovia e fazia frio – em contraste ao dia anterior quente e abafado – e fiquei muito feliz porque ao ver que a estação de autocarros, estava mesmo “colada” com a de comboios, soube imediatamente que iria conseguir apanhar o comboio para WuChang o que me permitia a ligação posterior para Hankou e daí para Nanquim.

Uma vez que o comboio estava cheio, comprei o bilhete sem lugar marcado, e dirigi-me para a plataforma e… o comboio só apareceu às 19.50! Já dentro do comboio o atraso continuou a aumentar e só saímos da estação de Changsha às 21.00. Era a primeira vez que tal acontecia durante a viagem! E tinha de ser precisamente neste dia de ligações altamente intricadas! :/ Nesse momento tive a certeza absoluta que não iria chegar a tempo, rosnei pragas e estava irritado, muito irritado: “Tanta m@§£€, para uma caganita!” Sem nada poder fazer relativamente a esse assunto, aproveitei a viagem entre Changsha e WuChang – uma das três cidades que forma a megalópole de Wuhan – para escrever no caderno, levantar-me para “esticar” o corpo, comer qualquer coisa e sentir os olhos a fechar fruto do cansaço. Pensei: “Quando lá chegar, logo se vê como mudo de estação” e conheci um chinês que era engenheiro informático (mas que parecia um rapazito) e em quinze minutos de conversa, ele informou-me que existiam autocarros que ligavam as diferentes estações de comboio de Wuhan, vinte e quatro horas por dia. 🙂


Reflexão: Aprende de vez… que sofrer por antecipação, não compensa!  😉

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Tigres e Escoceses

Ato VI – O  Grande Embuste!

Quando chegámos à Tina´s Guesthouse, bebemos finalmente a nossa cerveja sossegados e ficámos a conversar sobre o ocorrido. Durante a conversa, chegámos à conclusão que parte da informação recebida em Lijiang e antes de começarmos o trilho era em parte faliciosa e que a beleza natural do local não merecia um esquema destes! :/ Na despedida, trocámos e-mails e um abraço sentido e eu fiquei com uma certa pena das nossas rotas não coincidirem. Haveria de ter sido engraçado, viajar com este Escocês! 😀 Já no autocarro, a caminho de Lijiang vi o rio e a garganta mais de perto e com outra atenção e só então percebi, que o clímax do Tiger Liping Gorge se encontra no Upper Gorge. Aí, SIM! O rio mostra toda a sua força, presença, raça e carácter! E fiquei a matutar na seguinte questão: quem chega ao Tiger Lipping Gorge transportado por um autocarro da Tina´s Guesthouse é automaticamente levado a fazer o trekking e a seguir montanha acima em direção ao Middle Gorge e ao embuste! :/

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Relativamente ao trekking não tenho nada a opôr, o mesmo é excelente e oferece-nos uma palete de paisagens vasta, rica e distinta. Porém e remetendo-me apenas à informação, ou melhor desinformação providenciada pelos hostels/guesthouses/hotéis de Lijiang, impedir as pessoas de ver o verdadeiro Gorge, o Upper Gorge, só me faz sentir irritado e enganado, pois está-se a deturpar a realidade do local apenas com o objetivo de ganhar dinheiro e enriquecer à conta de um embuste. 😦 Por este motivo, se de algum modo, puder alertar todos os outros turistas/backpackers/viajantes para esta situação ou situações semelhantes noutros locais do planeta, será isso que farei! Afinal vivemos em comunidade e sociedade e se todos juntos podermos “quebrar” os “maus” sistemas que nos rodeiam diariamente, tanto melhor! 😉

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Tigres e Escoceses

Ato III – Half-Way Guesthouse

Para chegarmos à guesthouse na qual ficámos a pernoitar demorámos seis horas e esta não tinha o nome mais certeiro, uma vez que estávamos muito mais avançados do que meio caminho. Aliás, pelas informações recolhidas, o Tiger Liping Gorge estava “ao virar da esquina”, apenas a uma horinha de distância. 🙂

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De qualquer modo e esquecendo o pormenor do nome, o nosso poiso foi uma excelente surpresa. A construção era toda em madeira, a vista para as montanhas era espectacular, a sala de refeições e o pátio interior eram agradáveis, as sanitas tinham uma panorâmica sete estrelas! 😛 O quarto tinha bastantes camas, mas era limpo e não era nenhum cafunfo e tanto a dormida como as refeições tinham bons preços, até a cerveja tinha um valor acessível. 😉

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Quando entrámos no quarto, este estava minado de americanas e o escocês – Andy – e o “F+*&%@£ Gipsy” – nome pelo qual fui batizado pelo Andy – transformaram-se em autênticos palhacitos para tentarem quebrar o gelo. Entretanto e de um modo “delicado”, ofereci um pacote de leite a uma delas e quando esta começou com as “polidezes” do ai não posso aceitar – as palavras dizem que não, mas a cara diz que sim – só se pode dizer algo suave, algo do género: “I don´t give a f$&@, it´s yours.”

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Depois da nossa “entrada triunfal” só nos restava bater em retirada e não havia sítio melhor para nos “refugiarmos” que a sala de refeições. Ao jantar, comemos noodles instantâneos, batatas fininhas, beringela e cerveja… cerveja e mais… cerveja e continuámos a conversar. Sobre? Viagens! Uuuuuu. Esta era difícil! 😉 Paquistão, Bangladesh, Myanmar, Vietname, Laos, Cambodja, Bornéu (tanto o lado Malaio como o lado Indonésio)… o Andy não parava de contar histórias e eu ouvia-o atentamente! Foi uma experiência extremamente enriquecedora e eu só pensava: “Este gajo é o maior!”. 😀

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Antes de me deitar, fumei dois cigarros e de um modo instrospectivo olhei a montanha negra recortada na escuridão e ao ouvir o rio correr, pensei que Viajar é parte da minha essência mais profunda. 😀

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Validades

No dia de regresso a Chengdu, ao comprar uns mantimentos para a viagem, reparei pela primeira vez que todos os produtos que comprara estavam fora de validade, inclusivamente o leite. Mas não se pense que era uma ou duas semanas. Não! Meses! No caso do leite, quatro meses! Fiquei a pensar se tal seria consequência do afastamento do parque natural ou se seria uma situação generalizada e decidi que nas próximas oportunidades iria investigar esta questão. 😛

P.S. – Apenas como curiosidade para o leitor. Sim! Acabei por consumir todos os produtos que comprei e não… Não senti nada de anormal no meu organismo! 🙂

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Jiuzhaigou, Fairy Tale

Aparte

Antes de continuar a relatar os factos, vou apenas fazer um duplo aparte. Para se entender a importância que Jiuzhaigou tem na China e no turismo do país é melhor começar por explicar a realidade. Assim sendo, vamos começar pela economia. O parque cobra em época baixa 80Y de entrada, 80Y para os autocarros e para além disso permite a compra de um bilhete para um segundo dia por um valor simbólico de 20Y. Em época alta, a realidade muda radicalmente. O bilhete de entrada passa a custar 220Y! O custo dos autocarros mantem-se inalterado e deixa de ser possível comprar um bilhete para um segundo dia por um valor simbólico. Resumindo, o parque natural de Jiuzhaigou é de tal modo famoso, que se dá ao luxo de cobrar qualquer coisa como 40€ por dia em época alta! :/

Outro luxo a que Jiuzhaigou se dá é o da imposição! :/ O parque tem a forma de um “Y”, é vastíssimo e da entrada até aos extremos distam qualquer coisa como cinquenta quilómetros! Como ninguém está autorizado a dormir no interior do parque, exceto as populações locais que vivem nas aldeias existentes no seu interior, o staff assume que o turista quer visitar toda a extensão do parque, e como tal, o autocarro mais do que fundamental, torna-se uma obrigação! Desse modo, comprar “apenas” o bilhete de entrada pelo menos para o primeiro dia é algo muito difícil de conseguir.

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Dujiangyan. “Esta é a minha praia!”

      

No dia seguinte, fui até Dujiangyan visitar a obra hidráulica mais antiga do mundo! 🙂 O fabuloso sistema de irrigação construído em 256 a.C. por Lin Bin e pelos seus conterrâneos, que demorou oito anos a concluir. Para lá chegar necessitei de andar duas horas de autocarro, uma dentro da imensa Chengdu e a outra para percorrer os setenta quilómetros que separam as duas cidades.   

       

Durante o dia, observei as visitas turísticas de bandeirinha em riste e senti-me diferente pois era o único ocidental entre multidões. 🙂 Vi um extraordinário exemplo de megalomanismo chinês, quando no topo da colina Yulei me deparei com seções e seções de escadas rolantes! :/ Ao percorrer esta fantástica obra de engenharia, vi a “modelação” operada no rio Min e toda a sua envolvente: as ilhas, as múltiplas pontes, os jardins harmoniosos e super bem cuidados, as margens e a cor da água do rio, os templos grandiosos e majestosos (Erwang e Fulonguan), os pavilhões, as muralhas e torres, a pagoda Yulei e senti-me um privilegiado. 😀 Aliás, foi mais intenso do que isso! Senti-me talhado para viajar! Para a vida de nómada! Se houve quem nascesse para ser pintor, escritor, padeiro, engenheiro, porque não há-de alguém ter nascido para viajar!? Este é o meu habitat, o meu ambiente. Esta é a minha essência. Esta é a minha praia! 😀

            

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Apple/Mountain Boy

Depois do loooooongo périplo e finalmente já no quarto do hostel, conheci Wang, um rapaz de Pequim que nos primeiros instantes não largava o i-pad. A verdade é que durante o resto da tarde/noite ele acabou por ser a minha companhia e estivemos a falar durante horas sobre montanhas, sobre a China, maneiras de viajar (turística ou “não turística”), as minhas dificuldades de linguagem e alfabeto e o quanto esse facto me limitava a ir a certas zonas do país. Acabámos o dia, a jantar baozis (massa cozida a vapor com recheios de carne ou vegetais no interior), dumplings e um caldo doce (que não consegui fixar o nome). Antes de dormir ainda houve tempo para um passeio numa daquelas zonas do novo turismo chinês, do tipo: “quanto mais caro melhor!” e, ao olharmos para tudo aquilo, sentimo-nos como estranhos que observam curiosos os peixinhos dentro de um aquário. 🙂

            

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Crónicas Em trânsito O 1º Dia

Quando a Bota, não bate com a Perdigota

Quando cheguei a Chengdu dirigi-me à zona dos autocarros para apanhar o BUS número 57, como “mandavam” as indicações tiradas da Internet para chegar ao hostel, e qual não é o meu espanto quando começo a procurar e… não existe nenhum BUS número 57 (pelo menos naquele local). “Oh diabo! Começamos bem!” Com os caracteres chineses na mão dirigi-me a um rapaz e mostrei-lhe o papel e apesar dele não falar inglês lá percebeu o que eu queria. 🙂 Com uma rapidez super-sónica a comparar caracteres, indicou-me um autocarro que parava naquele local. Entrei e mostrei o papel ao motorista que acenou que sim com a cabeça.

Começamos a viagem, autocarro cheio e eu posicionado estrategicamente para sair quando recebesse sinal. O problema é que o tempo foi passando, passando, passando e nada…”Oh diabo! Mas o hostel é assim tão afastado do centro?”. Quarenta minutos depois já pensava: “Mal por mal, acho que já prefiro que se tenham esquecido de mim.” Uma hora depois o autocarro estancou já só comigo a bordo e nessa altura, dirigi-me ao motorista que olhou para mim e fez uma cara que dizia tudo: “Epá! Esqueci-me completamente de ti!” A moral da história é que tive de sair do autocarro, apanhar outro com o mesmo número mas com outro motorista e… voltar a pagar o bilhete! Tempo e dinheiro perdidos na chegada a Chengdu, capital da província dos Pandas.