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O que ter Tempo faz, a este Pobre Rapaz

Se o dia anterior se pode assemelhar a uma maratona, o dia seguinte não foi mais do que um passeio num dia soalheiro. Aliás, posso afirmar que este foi de longe o dia mais tranquilo que alguma vez tive em viagem. A manhã, foi passada tranquilamente no hostel e quando saí do mesmo foi para deambular ao acaso com o Ryan. Só a partir das 15.30 saí do hostel com um objectivo pré-determinado, visitar o parque de Beihai.

Mais importante do que tudo, não senti remorsos por estar a “desperdiçar tempo” ou que devia estar a ver algo. Não! O meu chip desprogramou-se e foi reprogramado. Vamos ver nos próximos tempos com que profundidade. Penso que o fator-chave, nesta situação é claramente o tempo e o facto de este não ser a premissa condicionante desta viagem, pela primeira vez existem outras premissas a sobreporem-se a ele. Ai, a diferença que ter tempo faz, a este “pobre” rapaz. 😉

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Crónicas

O Americano e o Português sentados à mesa num Chinês

Quando regressei ao hostel depois de um dia tão cheio de pequenas aventuras conheci Ryan, um Americano que dizia falar chinês e passados uns momentos de conversa quando ele perguntou ao “público” em geral se alguém queria ir jantar, aquela pareceu-me a oportunidade ideal para tirar a barriga da miséria. Não precisámos andar muito para encontrar o que procurávamos: um local pequeno, frequentado por nativos e preços aceitáveis. Aí e finalmente tive o prazer de comer a deliciosa comida chinesa pela primeira vez, uma vez que a experiência da noite anterior fora um autêntico fiasco. Este jantar foi um coroar de um dia perfeito que começou na Muralha da China e acabou numa conversa entre um Americano e um Português sentados à mesa de um chinês.

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O Esquema Dourado

Após a finalização do meu repasto, estava alegremente sentado e sossegado num banco na Rua de Qianmen, quando se abeiraram três senhores que meteram conversa. Com um inglês bastante bom, o melhor que tinha apanhado na China até ao momento, disseram que eram uma equipa de informáticos de Xangai que estavam em Pequim por motivos profissionais (um congresso) e perguntaram se os queria acompanhar.

Detalhe do Pórtico

Como não estava a fazer nada de especial, acabei por me levantar e comecei a conversar com eles em andamento. Perguntaram de onde era e o que estava a fazer em Pequim. Disseram que Portugal era muito bonito e que um deles já tinha visitado o país duas vezes. Se era a minha primeira vez na China e outras trivialidades. Disseram que estavam hospedados no Marriot, porque o patrão é que pagava e eu respondi a sorrir sorte a deles porque eu estava num hostel barato, nas imediações da Cidade Proibida. E nos entretantos disseram que tínhamos de trocar e-mails, para quando fosse a Xangai ficar em casa deles e conhecer as respectivas famílias.

Edíficio na Rua Quianmen

Neste momento, tínhamos parado em frente a um edifício de fachada perfeitamente banal e eu como ando sempre com papel e caneta, sentei-me num banco e preparei-me para anotar os respectivos e-mails. O mais conversador dos três disse que não podíamos estar ali sentados e eu na minha candura pensei: “Coitados nem sequer podem ser vistos à conversa com um Ocidental na rua” e começou a dizer que devíamos tomar um chá, enquanto trocávamos os e-mails e apontou para o edifício. Naquele momento, racionalmente não pensei em nada mas instintivamente comecei a retrair-me. Continuou: “O chá é muito importante na nossa cultura e é considerado uma falta de respeito não tomarmos um chá juntos”. Naquele momento e repito-o instintivamente, respondi secamente: “I don´t care” (Não quero saber). E num ápice desapareceram como o vento deixando-me sozinho no local. Passados uns breves instantes, voltei à realidade e só nesse momento percebi que estive muito muito próximo de cair num Esquema Dourado de valores astronómicos. Esquema esse, que consiste em levar-nos a beber um simples chá para no final nos ser cobrado um valor monetário perfeitamente ridículo (que pode chegar às centenas de dólares). Caso a pessoa se negue a pagar, a intimidação física será a arma utilizada para nos convencer a fazê-lo. Esta informação foi confirmada à posteriori, com outras pessoas.

Pórtico de Entrada em Quianmen

Mentalmente comecei a rever todos os pequenos passos que me tinham conduzido até aquele edifício e tentei fixar o máximo de detalhes da conversa que tivera e a desconstruí-la em passos na perspectiva do predador, a saber:

1)      Identificação com a vítima;

2)      Mostrar que se é de confiança;

3)      Perguntas (de forma discreta) com o objetivo de extrair informação;

4)      Apelar ao coração da vítima;

5)      Capacidade de adaptação;

6)      Distração (o facto de serem três era apenas para criar entropia).

Para finalizar refiro apenas que não caí neste esquema elaboradíssimo e bastante profissional por mera sorte e instinto animal. Não houve qualquer mérito da minha parte em evitar este esquema e apenas frisei os passos para alertar possíveis vítimas, seja deste, ou de qualquer esquema, uma vez que o padrão será (quase) sempre semelhante.

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Crónicas

Sr. Agente Ajuda-me a Regatear?

Após um feliz regresso à poluição e tendo em conta a falta de nutrientes essenciais, o meu organismo pobre diabo, estava com larica. Na zona de Qianmen encontrei o que procurava, uma vendedora de “farturas” chinesas, ou seja, massa frita bem ensopadinha em óleo. Como a cavalo “encontrado” não se olha o dente, que se lixe o colesterol, os lípidos, as glicoses, frutoses, sacaroses…e tretas do género. Vamos é comer qualquer coisinha. 😛

A minha querida Vendedora

A bancada apenas tinha informação em chinês (pelos vistos, o rapaz ainda não percebeu que está na China) e como não queria ser enganado aproveitei a passagem circunstancial de um Sr. Agente da autoridade, vulgarmente denominado polícia, bófia…e em algumas circunstâncias mais fogosas de filho da !$#% para cima. Parei o Sr. Agente e tentei falar-lhe em inglês, mas não surtiu grande efeito. Por gestos consegui mostrar-lhe que queria comprar uma farturinha e ele tal e qual um pai que acompanha a criancinha, lá foi comigo até à banca da senhora perguntar quanto custava o abençoado frito. A vendedora olhou para mim e fez-me sinal de 6Y e eu que já tinha preparado umas notinhas para regatear, tirei as minhas 4 notas de 1Y do bolso e mostrei que não tinha mais (claro que tinha, mas na carteira). Ela acenou que não, eu insisti que só tinha aquele dinheiro e com a mediação do Sr. Agente, que deve ter ficado com pena de mim, venci mais uma batalha no jogo do regatear. Quando comecei a comer, o óleo escorria frito abaixo. Mas naquele momento a fomeca fazia com que aquela “fartura” fosse a mais refinada à face da Terra. 😀

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Crónicas Fotografia O 1º Dia

O Primeiro Dia em Pequim

O primeiro dia em Pequim correspondeu ao primeiro dia da viagem (vá, vamos excluir os aeroportos e os aviões, porque esses pouco se alteram em qualquer lugar do mundo, correspondendo a um modelo previamente standarderizado). Quando aterrei o dia estava cinzento e enevoado. “Oh diabo! Welcome to smog my friend?” A ver vamos. No aeroporto, para sair para a zona das bagagens foi necessário aguardar numa fila o controlo dos passaportes e de um “cupão” que é importante para o controlo de emigração e deve ser entregue à entrada e à saída do país. Mas não se pense que o controlo dos passaportes só é aplicado aos ocidentais, não senhor! Aplica-se também aos próprios cidadãos. Ora muito bem! Cá temos um primeiro cheirinho a burocracia. Quando ia a caminho do metro passou por mim um ocidental e na zona de comprar os bilhetes meti conversa com ele. Para minha sorte calhou-me na rifa um italiano (Stefano) que já vive na cidade há sete anos e durante a nossa viagem até ao centro de Pequim, contou-me coisas sobre si e deu-me algumas dicas.

Já na hostel (que foi bastante fácil de encontrar) e apesar do cansaço (esquecer-me recorrentemente de objetos antes de sair, acho que foi a faceta mais visível) o meu objetivo passou por continuar acordado e manter o ritmo o mais normalizado possível. Desse modo, o corpo é forçado a começar a habituar-se ao horário do destino. O resto do dia foi passado a deambular por Pequim de forma errática e sem grandes objetivos definidos. Acabei por seguir até aos muros exteriores da Cidade Proibida por uns hutongs (ruas e vielas que formam um bairro, em que as casas tem tradicionalmente pátios interiores) e seguidamente dirigi-me ao parque Jingshan (no seu interior este parque alberga alguns pavilhões chineses, que se localizam no topo de uma colina e proporcionam uma bela panorâmica sobre a Cidade Proibida, mas não neste dia) onde andei tranquilamente a passear com um chinês que pôs conversa comigo quando estávamos sentado num banco do jardim.

Saí do parque e continuei a deambular por avenidas monumentais e por mais hutongs. Aqui, pela primeira vez entrei numa mercearia e sem falar uma palavra de chinês e só com comunicação gestual consegui comprar uma garrafa de água de litro e meio (que inicialmente custava 5Y) por 1Y, percebendo automaticamente a importância que o regatear tem na cultura deste país. De rua em rua, viela em viela fui parar à rua principal do hutong mais antigo da cidade (Nanluogu Xiang) e lembrei-me de uma citação de Theroux: “É axiomático que logo que um lugar ganha a reputação de ser um paraíso se torna um Inferno” – a rua era um misto de discoteca pirosa e de um circo. Enfim demasiado turístico e demasiadas pessoas para o meu gosto, mas se calhar é melhor começar-me a habituar e rapidamente ao turismo de massas aqui na China.

Quando saí desta zona de hutongs, não sabia onde é que andava e o melhor foi quando abri a mala para ir buscar o mapa e verifiquei que não o tinha, a cereja no topo do bolo veio quando me apercebi que nem sequer o nome da rua ou localização do hostel tinha comigo. Nesta altura, tentei recorrer à ajuda de algumas pessoas que passavam na rua ou que trabalhavam em lojas ali nas imediações mas comecei a perceber que o inglês continua a ser pouco falado (mesmo em pessoas mais jovens). Moral da história: cansado, perdido (durante mais ou menos hora e meia) e sem perceber uma única letra que me rodeava ou palavra que me diziam comecei a ficar nervoso e a pensar como raio me ia livrar daquela situação incómoda que tinha criado. Após uns momentos de reflexão lembrei-me de ir a um hotel grande (em que aí falam inglês) pedir um mapa e para marcarem onde estávamos. Com base no mapa e na minha bússola lá me consegui orientar e voltar à base – apenas por curiosidade, diga-se que estava aproximadamente a três quilómetros na direção Noroeste.

Quando ia a chegar ao hostel estava esfomeado e encontrei um famoso mercado de rua noturno com comida, porém para o dia acabar em beleza paguei 17Y por um pratito de noodles mal-amanhado e reaprendi que antes de concluir qualquer negócio só mostro o dinheiro depois de acertado o preço (nem que seja por mímica). Já no hostel confirmei que na China o Facebook está bloqueado (tinha quase a certeza deste facto) e a má surpresa veio quando percebi que nem no blog conseguia entrar (também bloqueado). Depois de avisar que estava tudo bem (via skype, o telemóvel desde Barcelona que não tinha rede) finalizei a preparação para Muntianyu e às 20.00 já estava a dormir o merecido sono dos viajantes.